ANÁLISE E
ATIVIDADES DA MÚSICA GENI E O ZEPELIM
15-05-2014 17:52
Geni e o Zepelim
CHICO BUARQUE
(isso
é um repost, fonte no final)
De tudo que é
nego torto
Do mangue e do
cais do porto
Ela já foi
namorada
O seu corpo é
dos errantes
Dos cegos, dos
retirantes
Dá-se assim
desde menina
Na garagem, na
cantina
Atrás do tanque,
no mato
É a rainha dos
detentos
Das loucas, dos
lazarentos
Dos moleques do
internato
E também vai
amiúde
Com os velhinhos
sem saúde
E as viúvas sem
porvir
Ela é um poço de
bondade
E é por isso que
a cidade
Vive sempre a
repetir
Joga pedra na
Geni!
Joga pedra na
Geni!
Ela é feita pra
apanhar!
Ela é boa de
cuspir!
Ela dá pra
qualquer um!
Maldita Geni!
Um dia surgiu,
brilhante
Entre as nuvens,
flutuante
Um enorme
zepelim
Pairou sobre os
edifícios
Abriu dois mil
orifícios
Com dois mil
canhões assim
A cidade
apavorada
Se quedou
paralisada
Pronta pra virar
geleia
Mas do zepelim
gigante
Desceu o seu
comandante
Dizendo:
"Mudei de ideia!"
Quando vi nesta
cidade
Tanto horror e
iniquidade
Resolvi tudo
explodir
Mas posso evitar
o drama
Se aquela
formosa dama
Esta noite me
servir
Essa dama era
Geni!
Mas não pode ser
Geni!
Ela é feita pra
apanhar
Ela é boa de
cuspir
Ela dá pra
qualquer um
Maldita Geni!
Mas de fato,
logo ela
Tão coitada e
tão singela
Cativara o
forasteiro
O guerreiro tão
vistoso
Tão temido e
poderoso
Era dela,
prisioneiro
Acontece que a
donzela
(E isso era segredo
dela)
Também tinha
seus caprichos
E ao deitar com
homem tão nobre
Tão cheirando a
brilho e a cobre
Preferia amar
com os bichos
Ao ouvir tal
heresia
A cidade em
romaria
Foi beijar a sua
mão
O prefeito de
joelhos
O bispo de olhos
vermelhos
E o banqueiro
com um milhão
Vai com ele,
vai, Geni!
Vai com ele,
vai, Geni!
Você pode nos
salvar
Você vai nos
redimir
Você dá pra
qualquer um
Bendita Geni!
Foram tantos os
pedidos
Tão sinceros,
tão sentidos
Que ela dominou
seu asco
Nessa noite
lancinante
Entregou-se a
tal amante
Como quem dá-se
ao carrasco
Ele fez tanta
sujeira
Lambuzou-se a
noite inteira
Até ficar
saciado
E nem bem
amanhecia
Partiu numa
nuvem fria
Com seu zepelim
prateado
Num suspiro
aliviado
Ela se virou de
lado
E tentou até
sorrir
Mas logo raiou o
dia
E a cidade em
cantoria
Não deixou ela
dormir
Joga pedra na
Geni!
Joga bosta na
Geni!
Ela é feita pra
apanhar!
Ela é boa de
cuspir!
Ela dá pra
qualquer um!
Maldita Geni!
Joga pedra na
Geni!
Joga bosta na
Geni!
Ela é feita pra
apanhar!
Ela é boa de
cuspir!
Ela dá pra
qualquer um!
Maldita Geni!
Quando trabalho
com o Realismo sempre uso a canção "Geni e o Zepelim". Ela contempla
muitos dos aspectos realistas... Vamos à analise.
Parte das
músicas mais geniais que já ouvi nasceram das músicas de duplo sentido ou de
mensagem subliminar de Chico Buarque. É o caso de “Geni e o Zepelin“, um dos
melhores momentos de “A Ópera do Malandro“.
A música é
cantada na peça pela personagem Genivaldo, um travesti que responde pelo nome
de Geni. A letra, entretanto, não nos dá essa informação, podendo, fora do
contexto da Ópera do malandro, referir-se tranqüilamente a uma mulher, até
pelas referências femininas (“ela”; “aquela formosa dama”), e pela ausência de
qualquer termo específico que nos indique tratar-se de um travesti” ( FONTES,
2003, p.81).
A música “Geni e
o Zepelim” (1978) apresenta o eu-lírico masculino cantando a musa ou a amante e
o eu- feminino que só pode ser exposto com a tutela do poeta. A temática
central da canção está na bondade/maldade que estão intimamente direcionados à
ação de Geni e na resposta da população. A bondade de Geni é demonstrada no
verso “[...] Tudo que é nego torto/ Do mangue do cais do porto/ ela já foi
namorada [...] rainha dos detentos/ das loucas, dos lazarentos” (FONTES, 2003).
Inicialmente se recusou a dar seu corpo para o comandante Zepelim que
representava o luxo e o poder. “Tão cheirando a brilho e a cobre”. Essa atitude
põe a cidade em perigo. A população aclama “Vai com ele, vai Geni/ Você pode
nos salvar/ Você vai nos redimir/ você dá para qualquer um / Bendita Geni”.
Para salvar a população a personagem Geni aceita o pedido de Zepelim,
personagem que nos chama muita atenção. O compositor dá a resolução da história
para Geni, a prostituta/mulher pobre e na peça a personagem é representado por
um homem. Cabe destacar vários elementos, um deles é o homem fazendo papel
feminino. Será que esta escolha não nos remete a questionar a rigidez dos
gêneros masculino/feminino? Ou quem sabe problematizar o discurso cultural
hegemônico que se baseia em binarismos.
O público que
assiste à peça constrói a imagem do travesti, pois identifica que o corpo é de
homem, mas as ações são femininas. O próprio nome da personagem Geni(Valdo) já
sugere o gênero como fluído, relacional, plural.
A atitude de
valorizar a mulher como ser humano transparece nas canções buarqueanas que
diretamente fazem alusão à infração das leis morais, como na mulher prostituta
ou homossexual. Neste universo, destacamos várias mulheres: a mulher
possessiva, a romântica, a dona-de-casa, a desafiante, a homossexual, dentre
estas, valor especial recebe a parcela transgressora do sistema social. Algumas
músicas explicitam essas temáticas, tais como: “Bárbara” (1973), que fala de
uma relação amorosa entre duas mulheres “vamos ceder enfim à tentação das
nossas bocas cruas/ e mergulhar no poço escuro de nós duas”. A temática
homossexual insere-se no movimento em prol da liberdade de expressão e de
orientações sexuais; contudo, ainda era tabu, tanto entre homens como entre
mulheres.
Talvez o que
mais encante na poesia de Chico Buarque, em se tratando do feminino e
masculino, seja o alargamento das expressões, que não fixa o ser-homem e
ser-mulher, mas permite transitar entre os sentimentos humanos. Diferentes
sentimentos são mostrados com poesia, permitindo falar do desejo da completude
de uma forma suave e melódica. Como na canção “Todo o sentimento” (1987), que
fala do amor maduro que pode adoecer... [...] Prometo te querer, até o amor
cair, doente...
DIVIDINDO A CANÇÃO
A canção pode
ser dividida em quatro grandes cenas:
A primeira, Geni
é apresentada como sendo promíscua, aquela que "dá-se assim desde menina,
na garagem, na cantina, atrás do tanque, no mato", é ainda qualificada
como “rainha dos detentos”. A personagem vai sendo “pincelada” aos poucos. As
características vão sendo narradas em recortes que vão desde a sua infância até
o momento da música. O primeiro refrão ajuda a criar essa visão sobre a
personagem.
A segunda, a
chegada do zepelim, A segunda cena apresenta o zepelim de modo grandioso e
temeroso. O recorte cai sobre as nuvens onde de modo assustador se revela o
zepelim destruidor. Em seguida, através
de um plano geral (PG), o poder do zepelim fica claro quando paira sobre
os edifícios, tamanha é a sua grandiosidade:
Um dia surgiu,
brilhante
Entre as nuvens,
flutuante
Um enorme
zepelim
Pairou sobre os
edifícios
Abriu dois mil
orifícios
Com dois mil
canhões assim
No momento
seguinte o plano da cena passa ao comandante do zepelim. A cena é apresentada
em plano médio e traz o diálogo à canção, revelando as intenções do invasor.
Aqui o refrão mostra a surpresa dos cidadãos com o interesse do homem por Geni,
é o ponto que elevará o status de Geni de marginal para heroína.
A terceira, que
transforma Geni em heroína, o momento já muda o modo de se referir à personagem
que é agora tratada por donzela. O recorte volta mostrando diversos momentos
distintos depois do pedido do comandante. Em certo momento o plano geral muda
para primeiro plano, apresentando personagens implorando o aceite de Geni:
Ao ouvir tal
heresia
A cidade em
romaria
Foi beijar a sua
mão
O prefeito de
joelhos
O bispo de olhos
vermelhos
E o banqueiro com
um milhão
A quarta, a
conclusão e volta de Geni ao submundo. Após o novo refrão, símbolo da cidade
aos pés de Geni, nos é apresentada a última cena da canção. Aqui novamente os
acontecimentos seguintes são apresentados em recortes.
Iniciando com a
decisão de Geni, passando ao momento do encontro entre Geni e o comandante do
zepelim e ao trágico fim onde de heroína Geni volta a ser personagem da margem,
vítima daqueles a quem ajudou:
Foram tantos os
pedidos
Tão sinceros tão
sentidos
Que ela dominou
seu asco
Ele fez tanta
sujeira
Lambuzou-se a
noite inteira
Até ficar
saciado
[...]
Num suspiro
aliviado
Ela se virou de
lado
E tentou até
sorrir
Mas logo raiou o
dia
E a cidade em
cantoria
Não deixou ela
dormir
Joga pedra na
Geni
Joga bosta na
Geni
[...]
Quanto aos
aspectos realistas, há muito a se comentar. Assim como o Realismo critica a
imagem feminina como anjo, imaculável, Chico em sua canção, disponibiliza a
todos "Geni". A prostituta/ homossexual/ discriminada/ não pura Geni.
Critica duramente a hipocrisia da sociedade como os casamentos arranjados,
perfeitos; e a Igreja Católica.
Ao
final do artigo, o site propõe algumas atividades para reflexão sobre tudo o
que foi mencionado. Seguem, abaixo:
ESTUDO DA CANÇÃO
GENI E ZEPELIM
1- Quem é Geni? Ela sofre algum tipo de
violência? Comprove a sua resposta com a canção.
2- Chico Buarque critica três instituições na
canção, que também são criticadas pelo Realismo. Cite essas três instituições e
como são representadas na canção.
3- Na 1ª parte da canção, o autor mostra a
personalidade de Geni, mas não de forma pejorativa. Cite os versos que
comprovam isto.
4- Explique que cidade era essa retratada
pelos versos: “E é por isso que a cidade / Vive a sempre a repetir”.
5- A situação se repetia, até surgir “uma
força superior”. Que força era essa e o porquê de superior?
6- O comandante ameaçou explodir a cidade.
Será que o horror e a iniqüidade provinham da “Formosa dama Geni” ou da cidade?
Justifique com os versos do texto.
7- A “cidade” se expressa de novo, se mostrando
incrédula quanto à escolha do comandante. Cite os versos que comprovam esta
afirmação.
8- Geni passa de MALdita para BENdita.
Explique como funcionam esses contrários.
9- O autor mostra poder como “algo sujo”, pela
forma como o comandante trata Geni durante a noite. Mesmo depois do sacrifício
dela, além de pedra, Geni recebe “bosta” também. Retire os versos que retratam
as duas situações citadas.
10- Há características realistas presentes na
canção. Cite-as e mostre os versos que comprovem suas citações.
Ler mais:
http://profaclaudiacem804.webnode.com.br/news/analise-da-musica-geni-e-o-zepelim/
Fonte: http://profaclaudiacem804.webnode.com.br/news/analise-da-musica-geni-e-o-zepelim/
Ao repostar, dê crédito à autora do texto.
*Prof.ª Mestra em Literatura Brasileira pela UNIMONTES Juliana Barreto juportugale@hotmail.com
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