Metáforas do fim do mundo*
E, então, sobrevivemos. Sobrevivemos
a mais um fim do mundo. Ou não. Talvez estejamos lutando e sobrevivendo, todos
os dias – dias de um fim do mundo, últimos dias de nossas longas curtas vidas,
todos os dias.
Nada como passar este dia 21 de
dezembro de 2012 assistindo ao filme baseado em uma das maiores obras
literárias de todos os tempos: Ensaio sobre a cegueira, de José Saramago. Relembrando
como intuitivamente nos tornamos cegos para não ver o que não nos é cômodo. Ou,
o contrário.
Cegas vítimas nos tornamos daqueles que nos manipulam como marionetes. Ver e enxergar deixam de ser sinônimos. E isso se torna claro na ferida causada pelo salto do sapato da prostituta, na perna do ladrão, deixando-a infectada pela sujeira das ruas. E também se torna claro como o quanto se perde de moral, de senso, de ética, de mínimo de pudor ou vergonha, quando se está “cego” e se luta pela sobrevivência em meio ao caos.
Cegas vítimas nos tornamos daqueles que nos manipulam como marionetes. Ver e enxergar deixam de ser sinônimos. E isso se torna claro na ferida causada pelo salto do sapato da prostituta, na perna do ladrão, deixando-a infectada pela sujeira das ruas. E também se torna claro como o quanto se perde de moral, de senso, de ética, de mínimo de pudor ou vergonha, quando se está “cego” e se luta pela sobrevivência em meio ao caos.
Saramago reflete o fim do mundo
em que se vive todos os dias: a moléstia da sociedade hipócrita e
individualista. Nesta “era do vazio”, nas palavras de Lipovetsky, em que as
pessoas matam e morrem sem motivos. Não há mais ideologias que movem. Toma-se
simplesmente o poder e dele se faz o que lhe for conveniente. E que o caos
reine. Porque a mesma impiedade que torna um ser “cego” torna-o “rei”, e muito
se aumenta a diferença entre o topo e o chão. Mas, na hora da morte, ou na luta
contra ela, quem é rico e quem é pobre? O que importa ser médico ou um idoso
que mais nada tem a perder, nem tem esperanças em seu resto de vida?
Para onde vão as belezas e as
riquezas diante de uma situação caótica? São menos sobreviventes de um fim do
mundo os mendigos e os abandonados, seja pela família ou pelo governo, quando
catam restos de dignidade em restos de comidas jogadas fora pela classe alta? O
que é o fim do mundo senão o momento em que já não se pode afirmar com certeza
se vivemos. Se se vive ou se se sobrevive. Se a morte vazia, de uma mente vazia
que mata crianças ou quaisquer inocentes, pune seus crimes. O que é o fim do
mundo senão o hoje que respiramos passivamente e o ontem que deixamos ser
derramado por entre os dedos, sem punição a quem merecia, sem salvação a quem
temia, sem conforto a quem sofria?
Fim do mundo é a morte em vida. Morte
e vida Severina, como bem disse João Cabral. É a fome. É a violência. O suicídio.
A falta de crença no que quer que seja.
O vazio.
Fim do mundo são os pais contra
os filhos e os filhos contra os pais. É a perda da dignidade devido a algo
imposto pelo sistema opressor. É fingir que se vive, como quem finge que ensina
ou quem finge que aprende.
Muitos brincaram, temeram,
blasfemaram ou ironizaram o fim do mundo. Fazemos isso a todo momento. E mal
sabemos que o fim do mundo não está próximo. Está. Simplesmente. É. Simplesmente.
É nosso momento e nosso presente. Porque, a partir do momento em que o dinheiro
importa mais que a honra, a beleza exterior mais que os sentimentos, o status
(tantas vezes falso) mais que a verdade... então já está estabelecido o caos.
Mesmo que não esteja chovendo
raio ou meteoros, nem haja dois sóis, ou “o número da besta” estampado nas
testas dos ímpios... estão soltas as feras. Os homens se matam a si e aos
outros. À natureza. Ao mundo. Vivemos no caos que criamos.
Somos vítimas-algozes nesta era
tão vazia de tudo, tão repleta de “nadas”.
*Por Juliana Barreto.
Profª de Língua Portuguesa, formada em Letras pela Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES Contato: ahhfalaserio@hotmail.com Página no Facebook: http://www.facebook.com/nossaquefacil
Bacana que o fim do mundo seja uma inversão de valores estamos precisando... rsrs
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